segunda-feira, 17 de agosto de 2009

"Leite Derramado", de Chico Buarque

Quando se chega a uma idade avançada, a mais provável realidade prende-se com a dependência de profissionais de saúde na satisfação das necessidades mais básicas. O sofrimento, a dor, a nostalgia são uma constante, difícil de compreender pelos mais novos e impossível de aceitar pelos que sofrem.
O passado é a única fonte de felicidade, porque o presente pouco ou nada é em termos de qualidade de vida, e o futuro uma palavra que não existe. A memória começa a falhar, por vezes mais do que seria normal.

"Na velhice a gente dá para repetir casos antigos, porém jamais com a mesma precisão, porque cada lembrança já é uma remendo de lembrança anterior.", In Leite Derramado

Mais do que nunca surge a necessidade de ter alguém que ouça as histórias e experiências que há para contar. Os amores e desamores, os ensinamentos, as peripécias, os erros, as traquinices. Infelizmente, o mais comum é já não haver ninguém para ouvir, ou mesmo que haja, mais tarde ou mais cedo acaba por se fartar de ouvir sempre as mesmas histórias. Os profissionais de saúde, são quase sempre o último recurso, a última esperança para quem não tem ninguém a quem falar. Uma enfermeira que surge e dá atenção ao doente que não tem ninguém, é muitas vezes idealizada por este como o amor que há muito perdeu e permite que o seu sonho continue, a sua utopia de voltar a viver o amor e tudo o que ele implica.

"Com o tempo aprendi que o ciúme é um sentimento para proclamar de peito aberto, no instante mesmo de sua origem. Porque ao nascer, ele é realmente um sentimento cortês, deve ser logo oferecido à mulher como uma rosa. Senão, no instante seguinte ele se fecha em repolho, e dentro dele todo o mal fermenta. O ciúme é então a espécie mais introvertida das invejas, e mordendo-se todo, põe nos outros a culpa da sua feiura.", In Leite Derramado

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