quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

"Desespero", Vladimir Nobokov

Todos podemos ser personagens de uma história, os actores principais de uma acção, passar de meros leitores a fundamentais participantes na obra que lemos. Não depende só de nós, mas fundamentalmente do autor, e da sua disponibilidade para nos receber, e capacidade para demonstrar essa receptividade.

"O sonho mais querido de um autor é transformar o leitor num espectador; consegui-lo-á alguma vez? Os pálidos organismos dos heróis literários, alimentados sob a supervisão do autor, incham gradualmente com o sangue vital do leitor; de modo que o génio de um escritor consiste em dar-lhes a faculdade de se adaptarem a esse - não muito apetitoso - alimento e prosperarem com ele, às vezes durante séculos."
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Quando se apodera de nós o desespero, haverá limites para as nossas acções? Não é o bem que nos preocupa, mas sim o mal que pode advir de uma acção realizada de acordo com a situação negativa em que nos encontramos num dado momento. São momentos em que cometemos os maiores crimes e comprometemos toda uma existência. Se somos punidos ou não, isso já não depende de nós.

"Supunhamos que eu mato um macaco. Ninguém me toca. Supunhamos que é um macaco particularmente inteligente. Ninguém me toca. Supunhamos que é um novo macaco - uma espécie sem pêlos e que fala. Ninguém me toca. Subindo circunspectamente estes degraus subtis, posso chegar até Leibnitz ou Shakespeare e matá-los, e ninguém me tocará, porque é impossível dizer onde foi atravessada a fronteira, para além da qual o sofista se vê em apuros."

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